sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Utilização da tração halo-craniana pré-operatória no tratamento de deformidades vertebrais de alto valor angular

Encontrei um artigo da USP de Ribeirão Preto de Julho de 2010, que pode elucidar melhor o tratamento que o Arthur está fazendo, vou colocar algumas partes dele aqui para que todos possam compreender melhor.


INTRODUÇÃO
O tratamento cirúrgico das deformidades graves e com alto valor angular da coluna vertebral representa um grande desafio devido às dificuldades intrínsecas para a sua correção ao risco de lesão neurológica associado. Além disso, em nosso meio, faltam recursos à monitoração intraoperatória dos pacientes, o que limita a utilização de osteotomias ou ressecções vertebrais na correção das deformidades. O risco de lesão neurológica pode aumentar na presença de história pregressa de alteração intraespinhal ou cirurgia prévia1,2.
Métodos de tração pré-operatória foram descritos para permitir correção gradual das deformidades, reduzindo as complicações de um procedimento corretivo agudo. As vantagens da tração são: menor solicitação mecânica submetida à interface osso-implante no momento da cirurgia definitiva por ser realizada em uma curva de menor valor angular e, uma vez que o paciente se encontra alerta durante o período de tração, possibilidade de avaliação contínua dos sintomas neurológicos, permitindo intervenção imediata, na eventualidade de sua ocorrência2.
Dentre os métodos de tração descritos destacam-se a halo pélvica, a halo femoral e a halo gravitacional. Em contraste à tração halo-pélvica e halo-femoral, a tração halo-gravitacional, popularizada por Stagnara, utiliza o peso corporal do paciente como uma contra força e não requer restrição prolongada no leito, permitindo a ele locomover-se por meio de cadeira de rodas ou andar com apoio especial1-3.
O objetivo deste estudo foi avaliar o uso da tração halo-craniana pré-operatória em pacientes com deformidades acentuadas da coluna vertebral e submetidos ao tratamento cirúrgico sem a monitoração intraoperatória das estruturas nervosas e realização de osteotomias ou ressecções vertebrais.

MÉTODOS
Foram avaliados 17 pacientes com deformidades de alto valor angular da coluna vertebral (10 do sexo feminino e 7 do sexo masculino) com idade variando 6 e 26 anos (média de 13,75±4,52 anos). Estes foram submetidos ao tratamento cirúrgico após período de tração. A etiologia das deformidades era neuromuscular em cinco pacientes, congênita em seis pacientes, neurofibromatose em dois pacientes, sequela de neoplasia intraraquídea em dois pacientes, idiopática em um paciente e raquitismo em um paciente. As características gerais dos pacientes estão ilustradas na tabela 1.
Todos os pacientes foram submetidos à instalação do halo craniano de acordo com a técnica descrita por Mubarak et al4. A tração foi iniciada 24 horas após a inserção dos pinos com 1 kg e aumentada com 1 kg por dia, de acordo com a tolerância de cada paciente e a presença de sintomas neurológicos que eram avaliados diariamente. Os pinos foram checados de 48 em 48 horas e, quando necessário, reapertados. O paciente permanecia em tração contínua em decúbito dorsal ou na posição sentada em cadeira de Stagnara (Figura1).


O tratamento cirúrgico foi realizado por meio da artrodese vertebral posterior isolada em nove pacientes e por meio da abordagem combinada (anterior e posterior) em oito pacientes. A abordagem anterior foi utilizada no intuito de aumentarmos a correção das deformidades por meio da liberação de partes moles e realizar a artrodese anterior nos casos com maior rigidez.
Os pacientes foram avaliados por meio de parâmetros clínicos: idade, sexo, patologia, tempo de tração e peso de tração; e radiológicos: medida da escoliose, cifose e lordose pelo método de Cobb. Os parâmetros foram avaliados no período pré-operatório, durante a tração e pós-operatório.

RESULTADOS
O tempo de permanência na tração halo-craniana variou de 14 a 106 dias (média de 34,5±20,83) e o peso máximo utilizado na tração variou de 5 a 14,5 kg (9,33±3,61). O peso utilizado representou, em média, 30% do peso corporal dos pacientes medido no início da tração (Tabela 1).
A medida da curva principal da escoliose no período pré-operatório variou de 45º a 163º (98,6±35,7º), de 27º a 144º (83,5±28,5º) durante a tração e de 19º a 135º (77±29,4º) no período pós-operatório (Figuras 2 e 3). A correção da curva principal da escoliose variou de 0º a 34º (17,58±12,8º) com a tração halo-gravitacional e de 8º a 70º (31,1±16,5º) no período pós-operatório. O percentual de correção da escoliose variou de 6,25 a 71,1% (27±49,5%) sendo 63% obtidos durante o período de tração (Tabelas 2 e 3).






Os valores da curva secundária da escoliose no período pré-operatório variaram de 25º a 110º (59,1±21,44º), de 8º a 109º (53,1±25,8º) durante a tração e de 4º a 108º (49,6±28,3º) no período pós-operatório (Figura 2). A correção da curva secundária da escoliose variou de 0º a 23º (10,4±8,8º) com a tração halo-gravitacional e de 0º a 44º (18,35±12,6º) no período pós-operatório (Tabelas 2 e 3).
A medida da cifose no período pré-operatório variou de 8º a 115º (86,3±32º), de 35º a 85º (62,2±19,9º) durante a tração e de 7º a 94º (60,3±20,9º) no período pós-operatório (Figura 4). A correção da cifose variou de 0º a 51º (23,5±15,2º) com a tração halo-gravitacional e de 0º a 60º (21,5±20º) no período pós-operatório. O percentual de correção da cifose variou de 0 a 47,2% (28,2±22,9%), com 92% da correção ocorrendo no período da tração (Tabela 2 e Figura 5).




A medida de altura da coluna vertebral variou de 17 a 46 cm (30,6±6,86) no período pré-operatório, de 22 a 42 cm (33,5±6,2) durante o período de tração, e de 24 a 46 cm (36,3±6,5) no período pós-operatório. O aumento da altura da coluna vertebral variou de 0 a 15 cm (6,4±3,9), sendo 51,7% durante o período de tração (Tabelas 2 e3).

DISCUSSÃO
A ocorrência de complicações como redução da função respiratória, úlceras de pressão, contraturas de partes moles e inabilidade de controle de deformidades pélvicas durante o tratamento de deformidades graves da coluna vertebral, por meio de trocas gessadas, estimulou a busca por novos métodos de tratamento5. Os primeiros relatos do halo-craniano descrevem sua utilização no tratamento da paralisia cervical associada à poliomielite por Nickel et al.6,7. A utilização do halo-craniano no tratamento das deformidades da coluna vertebral foi inicialmente descrita pelos mesmos autores1.
A utilização da tração halo-gravitacional no tratamento das deformidades da coluna vertebral baseia-se nas propriedades mecânicas dos tecidos biológicos demonstrados em estudos experimentais8. Em estudo clínico, foi demonstrado o comportamento da força de distração produzida pelas hastes de Harrington, ilustrando o relaxamento e a adaptação tempo-dependente da coluna vertebral submetida ao estresse contínuo8,9. Essa característica é denominada de viscoelasticidade.
Os casos bem sucedidos relatados pela literatura, com a utilização da tração halo-gravitacional, motivaram-nos a utilizá-la, considerando o menor risco de lesão neurológica, como visto em estudos da correção cirúrgica aguda das deformidades da coluna vertebral3. A correção cirúrgica aguda das deformidades vertebrais rígidas e de alto valor angular aumenta o risco do comprometimento neurológico, em especial na presença de cifose acentuada. O intuito do halo gravitacional é promover a correção cirúrgica das deformidades vertebrais, das mais diversas patologias, de maneira mais segura, obtendo resultados similares1,2.
Com o advento de novas técnicas cirúrgicas, de sistemas de monitoração neurológica e implantes modernos, existe grande debate no que diz respeito às indicações da tração com halo-gravitacional no tratamento das deformidades graves da coluna vertebral. Osteotomias e ressecções vertebrais contribuindo para correção de grandes deformidades são realizadas com mais segurança quando associadas à análise eletrofisiológica da medula e raízes nervosas por meio de potenciais evocados. Não existe controvérsia com relação à supressão da utilização do halo-craniano no tratamento de pacientes com curvas flexíveis e sem patologia intraespinhal.
A avaliação dos resultados do tratamento por meio de tração halo-craniana é complexa, pois a deformidade pode apresentar inúmeras etiologias (artrogripose, congênita, neuromuscular) tornando os parâmetros difíceis de serem comparados1,2.
A correção obtida em nossa série de pacientes foi satisfatória, estando de acordo com outros estudos, e deve ser ressaltado o cuidado para evitar-se a comparação entre diferentes patologias10. Em um estudo foi relatada heterogeneidade nos valores angulares de correção encontrados. Nas séries em que predominam patologias congênitas ou artrogriposis foram observados valores menores quando em comparação às séries que agruparam pacientes com deformidades idiopáticas e neuromusculares1.
A controvérsia persiste acerca do protocolo ideal para a tração halo- gravitacional4,5,11-15. O número de pinos cranianos, o peso e o dia inicial, o aumento do peso e o limite máximo de peso utilizado são questões ainda debatidas na literatura. O protocolo utilizado em nosso estudo compreendeu a instalação do halo gravitacional com 4 pinos cranianos, início da tração com 1 kg no segundo dia após a instalação do halo gravitacional, o aumento do peso era de 1 kg por dia até a tolerância do paciente ou ausência de melhora da correção1,2.
Em nossa série, um caso de soltura do halo gravitacional foi observado após a colocação inicial de peso (paciente sete), tendo sido resolvido com nova instalação do halo. Diferente de outros estudos não foram observadas complicações como perda da lordose, degeneração cervical apofisária, alterações neurológicas, infecção intradural e extradural em nosso grupo de pacientes1,2,12,13,15-24.

CONCLUSÃO
O tratamento cirúrgico das deformidades graves da coluna vertebral, por meio da utilização da tração halo-gravitacional pré-operatória, mostrou-se uma boa opção de tratamento, reduzindo os valores de correção intraoperatória, diminuindo, dessa forma, os riscos de lesão neurológica durante a correção cirúrgica.



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